Sunday, June 19, 2011
Dica à Receita de Além cinza
Alcançar o fundo do mar, mesmo em onda alta. Conseguir apanhar os peixes com os olhos, ainda que em água baça. Escorregar os pés em terra molhada, em noite escura. Suportar sombra à distância, em tempo de meio-dia. Caminhar horas em injusta dor, sem calor ou comforto paladar. Depois, correr a distância da praia da Enseada, os pés descalços, pela estrada, em noite escura. Equilibrar, por cima da cabeça, um cesto com frutos pesados e mais todos os sonhos-suplícios. Resenhar um livro de teoria política, em tempo de crise. Criar crítica a um livro de poemas de Maurice Harmon ou à quinta sinfonia, em tempo de carnaval. Construir uma casa, em ladeira opaca e fria. Mergulhar em rio lodoso para encontrar urtiga preciosa. Rezar todas as preces Bom Jesus acima e de joelhos. Andar pra trás, ou, do avesso, feito carangueijo e, por isso (ou, depois disso) só falar direito e escrever correto (pós-reforma ortográfica). Comer chouriço sem cozer a pele ou a intempérie de quem pede falha, de quem soluça cansaço. Nada disso é tão difícil do que acrescentar margaridas aos grãos de areia de W.Blake e ver mundos coloridos, onde só se vê lamento (cinza, com perdão do pleonasmo)!
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